segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Separação

Separação, como temos medo dessa palavra, como nos dá frio na espinha e povoa nossos piores pesadelos. Sofremos só de por um instante imaginar separar-nos da pessoa amada, dos nossos pais, filhos, irmãos, avós, tios, sobrinhos, amigos, afilhados, cachorros, gatos...

Como dói, como traumatiza, como magoa essa experiência, e é uma das realidades mais difíceis de se aceitar, a separação.

Por outro lado, não podemos negar que é parte da vida, que é tão real quanto a união e ela não pode ser anulada ou ignorada. Uns podem dizer “Que pessimismo!”, outros “Não é bom falar destas coisas...” e com certeza vários se preocuparão “Deve estar acontecendo alguma crise para esse tema vir à tona.” mas a resposta é n.d.a, nenhuma das anteriores, sem nenhum componente auto-biográfico, são pensamentos sobre o tema.

Estamos nesta vida para viver, e a realidade é o que existe, não podemos ignorá-la. Sabemos que ela é feliz, alegre e prazerosa, ao mesmo tempo que injusta, triste, cortante e sombria. Uma não existe sem a outra, só sabemos o que é o tudo porque existe o nada, e essa dialética também funciona para o dentro e fora, assim como para o ter e perder.

Não é falta de sensibilidade, nem excesso de racionalidade, nem tantos adjetivos que nos venham à mente quando tratamos deste assunto, a maioria preocupantes e amedrontadores. É simplesmente conhecer o percurso, saber os prazeres e os perigos da jornada e navegar entre eles como bons marinheiros, bon vivants. E nada melhor que deixar o tema para quem entende, fale poetinha...

Soneto De Separação
De repente do riso fez-se o pranto

Silencioso e branco como a bruma

E das bocas unidas fez-se a espuma

E das mãos espalmadas fez-se o espanto

De repente da calma fez-se o vento

Que dos olhos desfez a última chama

E da paixão fez-se o pressentimento

E do momento imóvel fez-se o drama

De repente não mais que de repente

Fez-se de triste o que se fez amante

E de sozinho o que se fez contente

Fez-se do amigo próximo, distante

Fez-se da vida uma aventura errante

De repente, não mais que de repente

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

“O segredo do meu sucesso é o equilíbrio: metade das minhas músicas é esquenta-sovaco e metade mela-cueca”. Tim Maia

Talvez essa tenha sido a única vez na vida que Sebastião Rodrigues Maia falou em equilíbrio. Tim, como disse Nelson Motta, era MUITO em tudo: com comida, com mulher, com malandragem, com drogas, com música, com talento… Um furacão por onde passava, sem destino, tragando tudo que via pela frente e fazendo música de primeira qualidade!

A história de Tim é para quem tem estômago e gosta de montanha-russa, se essa não é a sua praia, aperte o cinto porque como dizia ele: “Quem não dança segura a criança!

Anos atrás li o livro Vale Tudo do Nelsinho, e é dessa divertida obra que conheço um pouco da história desse “figura”...

Vendo sua vida com olhos “politicamente corretos”, Sr. Maia foi um doidão-fracassado, péssimo marido, cidadão e pai de família. Um exemplo a não ser seguido, uma página da nossa cultura popular a ser esquecida, mas o bom é que as coisas não são assim tão preto-no-branco, e entre essas duas cores surgiu Tim Maia do Brasil em plena Tijuca na Zona Norte Carioca.

Foi adolescente para os Estados Unidos de onde saiu deportado por furtos e drogas, depois começou a vida artística em São Paulo e finalmente voltou ao Rio para ser um fenômeno de vendas de LPs e um dos artistas mais marcantes da MPB do século XX.

Com o sucesso nas mãos, uma voz possante e um swing malandro no sangue, foi da fortuna à miséria, colecionou amigos e inimigos, lotou tantos shows quanto os que não compareceu, criou sua gravadora porque já tinha rompido relações com todas, e entre tapas e beijos não teve uma vida a dois sossegada. E nunca, nunca, “o retorno” esteve do jeito que queria...

Falar de Tim, sem falar de muitas drogas, álcool, mulheres (mais profissionais que amadoras) e comida, é falar de um músico genial, mas não é falar do Tim Maia do Brasil.

O malucão levava “essa vida desregrada” até aos ambientes mais corporativos e formais. Terminada uma temporada em Londres, Maia voltou ao Rio com várias folhas de papel cheias de LSD e na sua primeira passagem pela gravadora Phillips, começou distribuindo a novidade pelo Depto. de Contabilidade e em seguida pelo Jurídico. Colocava um pedacinho na mão de cada um dizendo: “Isso aqui vai abrir sua mente, melhorar sua vida e fazer você mais feliz. Não tem contra-indicações, não provoca dependência nem queda de cabelo e só faz bem.” Em outra visita à Flips, chegava “na maior viagem” quando os Diretores recebiam a visita dos chefes Holandeses, então rapidamente trataram de sumir com o Tim. O problema foi que o esconderam na sala do ar-condicionado e em dez minutos todo o escritório estava submerso na fumaça e no cheiro do baseado que ele inocentemente tinha acendido.

 “O problema do gordo é que se ele beija, não penetra, e, quando penetra não beija.”

“Fiz uma dieta rigorosa, cortei álcool, gorduras e açúcar. Em duas semanas perdi 14 dias.”

A única vez que Tim decidiu fazer exercício, mudou de idéia antes mesmo de sair de casa, e ficou ensaiando com a Vitória Régia vestido para a ginástica. Triathlon para ele era uma combinação de drogas, comida e álcool, e era parte da sua preparação para subir ao palco. Limites não existia no vocabulário do negão, para ele sempre vale-tudo!

Se acham que o Romário é um gênio não só dentro de campo, mas também com suas frases antológicas, Tim formaria uma perfeita dupla de ataque com o Baixinho. Abrindo o show no Instituto de Educação, famoso Colégio feminino na Tijuca, fez questão de homenagear as alunas: “Estou muito honrado de tocar para essas galinhas.” Quando dávamos nosso primeiro passo rumo à Democracia, soltou: “O Sarney nunca tomou trezentos LSDs nem comeu churrasquinho de gato com Ki-Suco como eu; não tem experiência para ser presidente, eu seria melhor que ele.” E em uma entrevista coletiva quando perguntado sobre planos para o próximo ano, respondeu: “Comprar uma bunda nova porque a minha já está rachada.”

Que as próximas gerações e o tempo permitam que “figuras” assim continuem colorindo a nossa história, sem elas seria tudo tão...

sábado, 21 de novembro de 2009

"Não venham com problemática que eu tenho a solucionática." Dadá Maravilha

A discussão sobre justiça e o futebol sempre vai e volta, mas agora com “la main de Dieu” de Henry o tema está em toda a imprensa e já virou além de papo de boteco, conversa de Primeiro Ministro.

Entre todos os esportes, o futebol é o que melhor retrata a vida, e a vida é assim, cheia de erros e injustiças, aonde as regras escritas da FIFA convivem com a malandragem dos jogadores dentro das quatro linhas e com os interesses de cartolas, árbitros e torcedores fora delas. C’est la vie.

O charme do futebol está na essência humana, na sua imperfeição. Dentro de todos nós existe o bem e o mau, o certo e o errado, e no futebol do Galvão Bueno está tudo isso lá, haja contradição em alta definição!

A beleza de um drible convive com a artimanha de “cavar” um pênalti ou uma expulsão, o discurso de respeitar o adversário sai da boca do mesmo jogador que humilha fazendo a embaixadinha no final da goleada, o espírito de grupo entrando de mãos dadas faz parte tanto quanto os sopapos e acusações trocados entre o zagueiro e o atacante na derrota. Que o diga Leonardo, o bom menino São Paulino quebrando a cara do Tab Ramos, Romário bad boy chorando igual criança ao ser cortado pelo Felipão e o símbolo maior das imperfeições futebolísticas: Ronaldo Fenômeno.

Essa é a realidade de qualquer pelada ou rachão, tão verde quanto a grama e preto e branco quanto a bola, e perder isso é perder o futebol, é transformar o esporte em videogame, a vida em Second Life.

Diferente de jornalistas e torcedores que acham que devemos colocar duzentas câmeras no campo, voltar a jogar partidas de resultado injusto e banir árbitros que prejudicaram algum espetáculo, defendo a injustiça, o erro, como parte do futebol assim como é parte da vida, e tentar fazer do esporte bretão um esporte 100% justo, além de impossível é uma tentativa sem graça de domesticar a nossa paixão, de reescrever o que já aconteceu, de distorcer a realidade, o que acontece seja no futebol seja em qualquer outro lugar.

Futebol é aceitar que a justiça nem sempre impera e muitas vezes ajuda os piores e prejudica os melhores. É aceitar o erro e sua existência, principalmente quando o “culpado” é aquele homenzinho de camisa amarela enfrentando 22 jogadores, comissão técnica, cartolas, imprensa armada até os dentes com tira-teima e leitores de lábio, e 80.000 apaixonados torcedores.

Futebol é não achar o Kaká certo e o Maradona errado, é ter um irmão Corinthiano e gritar “essa raça tem que acabar” quando caem para a segundona, é não trocar a cueca da sorte durante toda a Copa do Mundo, é lembrar da mãe do juiz quando anula um gol nosso, e dizer baixinho “roubado é mais gostoso” quando ele dá um pênalti que não existiu.. 


Futebol é preparar a caixa de solucionática porque lá vem problemática pela frente!

quarta-feira, 18 de novembro de 2009

Barack Obama e a Fé

Agora que Barack Obama deixou de ser Superman e voltou a ser humano, com defeitos e qualidades, erros e acertos, apoiadores e opositores, voltei a reler trechos do seu livro The Audacity of Hope e uma das partes que mais me identifiquei foi seu capítulo sobre a fé. Um tema “peludo”, como dizem os Venezuelanos, para meu segundo post mas todo viajante sabe que o desconhecido, o diferente pode nos impactar e assustar, o que não quer dizer que deixaremos de enxergá-lo, de conhecer sua realidade e para isso vale o bordão: “Cada um na sua e todos numa boa!”

Obama conta que sua mãe, como boa antropologista, o levava tanto a templos Budistas como à Igreja ou a cemitérios indígenas. Na estante da sala estavam a Bíblia, o Corão, o Bagavadguitá (livro sagrado Hindú) assim como livros sobre Mitologia Grega e Africana. Ele estudou em escolas Católicas, Muçulmanas e Protestantes, e mesmo com tanta diversidade e secularismo, afirma que sua mãe foi a pessoa mais espiritualizada que conheceu.

Stanley Ann Dunham, mãe de Barack, nasceu em Kansas em 1942 no midwest, coração do conservadorismo Americano, e recebeu seu primeiro nome porque seu pai queria um filho e não uma filha. A época, plena segunda guerra, era de forte patriotismo e promoção dos valores Americanos e mesmo assim, Ann, filha de um militar e uma operária da Boeing, ambos brancos e protestantes, antes de casar-se com Barack Obama Sr. já carregava seu filho. Abandonada pelo marido, que já possuía esposa e filhos no Quênia, resolveu estudar Antropologia e mais tarde voltou a casar-se, agora com um Indonésio com quem teve outra filha e de quem também acabou divorciando-se.

Entre tantos tombos Obama Jr. descreve sua mãe pelos seus valores como o amor, a caridade, a bondade e a gentileza. Ele fala de sua total reverência e devoção à beleza, ao valor e à transitoriedade da vida. Anna se emocionava com trechos de poesia, acordava os filhos no meio da madrugada para ver uma lua cheia, pedia que toda a família fechasse os olhos para ouvir melhor o barulho do vento nas árvores e ficava horas com uma criança no colo, qualquer criança, brincando, fazendo cócegas e tentando decifrar o milagre da vida entre aquelas mãos e braços rechonchudos.

Sem entrar na polêmica do livro ser parte de uma espetacular estratégia de marketing que levou Obama ao poder, a história de Ann Dunham e de Barack Obama é permeada por tantas culturas, credos e raças, em uma época em que poucos estavam abertos ao diferente e ao desconhecido, que ficam marcados os valores que os acompanharam nesta viagem, e sem dúvida um dos principais se chama fé.

sábado, 14 de novembro de 2009

A boat in the harbor is safe, but that’s not what boats are built for. (Paulo Coelho via Twitter)

Desde que decidi embarcar nessa aventura Bolivariana, de morar e trabalhar em Caracas, virei “maluco”. Amigos, colegas de trabalho, família e até o porteiro do prédio que morava em São Paulo perguntam: “E de onde você tirou essa idéia?”, “Quando acaba esse martírio?”e ultimamente, “Você tá tomando banho em três minutos?”

Quando menino, além de super-herói queria ser piloto de avião, mas me disseram que com 7 graus de miopia seria meio difícil. Então passei a ser aquela criança com óculos fundo de garrafa que todo vôo queria conhecer a cabine, e tive até a sorte de encontrar um piloto bacana que me deixou ficar por lá e ver a aterrissagem em Manaus. Caramba, sempre que penso nisso me dá uma nostalgia porque depois do 11 de Setembro nenhuma outra criança vai viver essa experiência...

Me lembro também de uma das primeiras dinâmicas de grupo que participei, para uma vaga de estágio no Banco Real, na área de Contabilidade. Me descrevi como um Aventureiro, e a mocinha do RH que coordenava a dinâmica perguntou: “Ah, que legal, fale sobre uma das suas aventuras.” No melhor da minha enrolação contei das minhas férias frustradas em Campos do Jordão, quando um amigo do cursinho e eu, tentamos ficar por lá um mês sem gastar dinheiro trabalhando como garçom e barman. Não fui contratado, acho que eles queriam um “contador de números” e não de histórias.

Minhas férias no Rio de Janeiro sempre tem um momento especial, escutar as histórias do meu avô na sala da TV.  Horas sobre sua infância, sua carreira no Exército, a família mudando de cidade em cidade, e um Brasil que só conheço por livros de história.

É, acho que quando nascemos uns já vem com o chip aventureiro e outros não. Sem certo ou errado, melhor ou pior, uns viajam pelo prazer da jornada e outros para chegar ao seu destino. Eu vim com esse chip, curto cada etapa, e viajar é meu destino.

Reflexões sobre o acidente do AF447 - texto de 2 de Junho de 2009

Cruzando o Atlântico

Mais de 500 anos atrás o comércio global dava seus primeiros passos, com navegadores Ibéricos e suas Caravelas cruzando oceanos rumo às cobiçadas Índias. As viagens levavam centenas de homens ao alto mar, que contavam nada mais com sua coragem para enfrentar anos de viagem rumo a um destino totalmente desconhecido, que na maioria dos casos acabava sendo conhecido, a morte. Com técnicas rudimentares e dependência total de ventos e marés, alguns afortunados venceram todos os revezes e catástrofes, chegando ao seu destino levando conhecimento e riquezas a seus países.

Passados trezentos anos, o homem seguia desafiando a natureza e seus oceanos, buscando novos mercados, conquistas de territórios e ainda o conhecimento. Acabo de ler “La traición de Darwin” do Argentino Gerardo Bartolome , um romance baseado em fatos reais sobre a viagem de Charles Darwin à América do Sul, a bordo da segunda expedição do HMS Beagle entre 1831 e 1836.

Conhecendo muito pouco sobre marés, ventos e correntes marítimas, e nada sobre metereologia , o capitão Fitz Roy e seus tripulantes partiram de Plymouth no Reino Unido cruzaram o Atlântico passando pela Ilha da Madeira, ilhas Canárias, Cabo Verde, Rochedo São Pedro e São Paulo, chegando a Fernando de Noronha no Brasil. Percorreram toda nossa costa, visitando Salvador e Rio de Janeiro, e depois desceram até o fim do mundo, a Patagônia. Dando a volta em nosso continente chegaram ao berço da Teoria da Evolução de Darwin, Galápagos e seguiram no caminho de volta à terra dos Windsors pelo Pacífico, navegando pela Oceania e Sul da Ásia, e contornando a África completaram a circunavegação. Chegaram de volta à Plymouth com pouquíssimas baixas e com a certeza de que essa viagem mudaria a história da humanidade, como de verdade mudou.

Nestes cinco anos de viagem, a comunicação era feita através de cartas, deixadas nos portos e depois recolhidas pelos navios Ingleses que faziam o trajeto contrário. Mensagens eram colocadas em garrafas, tanto em alto mar como em terra firme, em lugares aonde o homem branco nunca havia pisado antes. Assim, com tal velocidade “internética”, famílias ficavam meses sem notícias, sem saber o paradeiro de seus pais, maridos ou irmãos, e no caso de tantas expedições fracassadas as famílias nunca souberam o final real desta história de coragem e obstinação.

Quase duzentos anos depois ironicamente, nós continuamos usando a mesma rota para a travessia do Atlântico, com uma grande diferença, agora pelo ar. Os “expedicionários” de hoje em dia continuam buscando as mesmas coisas: negócios, riquezas, conhecimento, desbravar lugares desconhecidos e viver novas experiências. A diferença está somente no cenário; o que antes levava cinco anos, agora leva dias, e as cartas a cada tantos meses, agora são notícias “on line” e as técnicas e ferramentas de navegação avançaram de Cristóvão Colombo à Red Bull Air Race.

Mesmo assim, com tantos avanços e tecnologia, nestes primeiros dias desta semana temos vivido a mesma apreensão, que viviam as famílias dos circunavegadores de séculos atrás. O AF447 não chegou ao seu destino, não enviou uma mensagem quando era esperado, e até agora ninguém sabe como terminou esta expedição.

O momento é de consternação, de coração apertado, de buscar as causas, explicações e pensar em o que pode ser feito para que acidentes como esse possam ser evitados. E a partir daí temos que seguir em frente, fazendo com que esse espírito desbravador que nos leva a cruzar oceanos passe por cima de todos nossos medos e nos faça enfrentar tempestades, em busca de nossos objetivos. Com coragem e obstinação Darwiniana não podemos desistir daquela reunião de negócios, ou do tão esperado curso de línguas, ou da alegria naquela reunião de família, ou do prazer de comemorar mais um aniversário de casamento do outro lado do mundo, ou da plenitude de levar seu filho para conhecer o Mickey.

Adelante! Nada de Teoria da Involução...