sábado, 14 de novembro de 2009

Reflexões sobre o acidente do AF447 - texto de 2 de Junho de 2009

Cruzando o Atlântico

Mais de 500 anos atrás o comércio global dava seus primeiros passos, com navegadores Ibéricos e suas Caravelas cruzando oceanos rumo às cobiçadas Índias. As viagens levavam centenas de homens ao alto mar, que contavam nada mais com sua coragem para enfrentar anos de viagem rumo a um destino totalmente desconhecido, que na maioria dos casos acabava sendo conhecido, a morte. Com técnicas rudimentares e dependência total de ventos e marés, alguns afortunados venceram todos os revezes e catástrofes, chegando ao seu destino levando conhecimento e riquezas a seus países.

Passados trezentos anos, o homem seguia desafiando a natureza e seus oceanos, buscando novos mercados, conquistas de territórios e ainda o conhecimento. Acabo de ler “La traición de Darwin” do Argentino Gerardo Bartolome , um romance baseado em fatos reais sobre a viagem de Charles Darwin à América do Sul, a bordo da segunda expedição do HMS Beagle entre 1831 e 1836.

Conhecendo muito pouco sobre marés, ventos e correntes marítimas, e nada sobre metereologia , o capitão Fitz Roy e seus tripulantes partiram de Plymouth no Reino Unido cruzaram o Atlântico passando pela Ilha da Madeira, ilhas Canárias, Cabo Verde, Rochedo São Pedro e São Paulo, chegando a Fernando de Noronha no Brasil. Percorreram toda nossa costa, visitando Salvador e Rio de Janeiro, e depois desceram até o fim do mundo, a Patagônia. Dando a volta em nosso continente chegaram ao berço da Teoria da Evolução de Darwin, Galápagos e seguiram no caminho de volta à terra dos Windsors pelo Pacífico, navegando pela Oceania e Sul da Ásia, e contornando a África completaram a circunavegação. Chegaram de volta à Plymouth com pouquíssimas baixas e com a certeza de que essa viagem mudaria a história da humanidade, como de verdade mudou.

Nestes cinco anos de viagem, a comunicação era feita através de cartas, deixadas nos portos e depois recolhidas pelos navios Ingleses que faziam o trajeto contrário. Mensagens eram colocadas em garrafas, tanto em alto mar como em terra firme, em lugares aonde o homem branco nunca havia pisado antes. Assim, com tal velocidade “internética”, famílias ficavam meses sem notícias, sem saber o paradeiro de seus pais, maridos ou irmãos, e no caso de tantas expedições fracassadas as famílias nunca souberam o final real desta história de coragem e obstinação.

Quase duzentos anos depois ironicamente, nós continuamos usando a mesma rota para a travessia do Atlântico, com uma grande diferença, agora pelo ar. Os “expedicionários” de hoje em dia continuam buscando as mesmas coisas: negócios, riquezas, conhecimento, desbravar lugares desconhecidos e viver novas experiências. A diferença está somente no cenário; o que antes levava cinco anos, agora leva dias, e as cartas a cada tantos meses, agora são notícias “on line” e as técnicas e ferramentas de navegação avançaram de Cristóvão Colombo à Red Bull Air Race.

Mesmo assim, com tantos avanços e tecnologia, nestes primeiros dias desta semana temos vivido a mesma apreensão, que viviam as famílias dos circunavegadores de séculos atrás. O AF447 não chegou ao seu destino, não enviou uma mensagem quando era esperado, e até agora ninguém sabe como terminou esta expedição.

O momento é de consternação, de coração apertado, de buscar as causas, explicações e pensar em o que pode ser feito para que acidentes como esse possam ser evitados. E a partir daí temos que seguir em frente, fazendo com que esse espírito desbravador que nos leva a cruzar oceanos passe por cima de todos nossos medos e nos faça enfrentar tempestades, em busca de nossos objetivos. Com coragem e obstinação Darwiniana não podemos desistir daquela reunião de negócios, ou do tão esperado curso de línguas, ou da alegria naquela reunião de família, ou do prazer de comemorar mais um aniversário de casamento do outro lado do mundo, ou da plenitude de levar seu filho para conhecer o Mickey.

Adelante! Nada de Teoria da Involução...

Um comentário:

  1. Bem lembrado! Este seu texto já insinuava o que o atual Paraleloemeridiano confirma: o gosto pelo novo, pelo ousado, pelo aventureiro, responsável, mas aventireiro!
    Enjoy the ride !

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